quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

"O homem deve ser inventado a cada dia." Sartre.



Gabriel Marcel e o existencialismo:

A obra de Marcel é marcada por uma originalidade filosófica sem precedentes. Contemporâneo de Husserl, Heidegger, Merleau-Ponty e Sartre, Gabriel Marcel antecipa e infunde, já nas primeiras décadas do pensamento francês contemporâneo, um estilo de reflexão própria que levou à maturidade inúmeros temas e questões decisivas que encontraram lugar de destaque no movimento existencialista e fenomenológico. O fio condutor que atravessa toda a sua contribuição teórica é a temática da encarnação que ele mesmo caracteriza como o tema central de toda a metafísica. Assim, partindo da situação fundamental do homem como uma existência encarnada, isto é, como ser vinculado carnalmente à realidade concreta, Marcel explora substancialmente a ideia de uma participação ontológica mais ampla e profunda entre o humano e o mundo, entre o eu e o outro. A exemplo de outros pensadores de sua geração, Marcel foi um filósofo que reflete a situação humana num contexto histórico-filosófico extremamente crucial em que a humanidade assistiu uma irreparável crise cultural produzida, sobretudo, pelo advento da primeira grande guerra, pelos sistemas totalitários, etc. O ser humano percebe-se limitado, fragilizado e totalmente destruído diante da existência e constata que os sistemas de pensamento essencialistas, entre eles o idealismo, não fornecem uma resposta mais decisiva diante da crise que se abateu sobre a civilização. Sua filosofia, então, pode ser vista como um pensamento a caminho, como uma proposta de “filosofia concreta”, onde o transcendente aparece no centro de nossas experiências humanas, onde a descoberta de nossa situação como seres encarnados nos leva a uma participação no próprio ser. A partir desse contexto, Marcel passa a explorar a ideia do homem como projeto ou como um vir-a-ser. O homem deixa de ser uma essência, um ser definível de maneira exaurível para mergulhar na finitude e no presente como um ser encarnado. Ele se revela, antes de tudo, como uma experiência corporal. O corpo se torna uma categoria ontológica sem precedentes: ele se manifesta como uma experiência de mistério "eu não tenho um corpo, mas sou meu corpo"(Marcel).  É sob esta ótica que Marcel elevará o tema da encarnação como o dado central da metafísica. O que passa a entrar em jogo aqui é a interrogação radical sobre a existência humana, uma existência fragmentada e desumanizada, por isso, aos olhos de Marcel, a tarefa do filósofo deve visar absolutamente uma “filosofia do concreto”, no sentido de que o ato de filosofar deve ser o ato de“pensar em”, o que sugere uma relação com um “tu”. A filosofia nada mais é do que a tensão permanente entre o eu e as profundidades do ser no qual somos. Ao construir sua filosofia, Marcel partirá da questão da corporalidade, não afirmará que “eu tenho um corpo”, mas que “eu sou um corpo”,  utilizando a expressão "ser encarnado". O ser encarnado é a condição de acesso ao real, a concepção de corpo como ser encarnado nos faz sair do idealismo e “cair” no mundo da presença. O que Marcel pretende é compreender a realidade e a existência a partir do dado da encarnação, a partir do questionamento central da existência "Quem sou eu?"  Na vivência  encarnada do ser, por meio de posturas como recolhimento, fidelidade, amor, fé, compromisso, engajamento e esperança, percebemos o outro não como coisa, objeto ou um ser em terceira pessoa (ele), mas como um outro em segunda pessoa (tu); na percepção de que o outro é a possibilidade de auto-revelação. A existência é o ponto de partida e o ponto de referência da filosofia de Gabriel Marcel. Em oposição ao pensamento racionalista-idealista, objetivante e abstrato, antes que uma razão, somos  existência, real e concreta, inserida no mundo. Em outras palavras: a existência é, necessariamente, uma existência encarnada. Sendo um ser encarnado, nossa condição de ser existente nos é revelada de modo imediato e inconfundível como encarnação, isto é, enquanto a consciência mais gratuita de mim no meu corpo.

Referências bibliográficas:

MARCEL, G. Homo Viator. Torino: Borla. 1967.

ZILLES, U. Gabriel Marcel e o Existencialismo.

Site de referência:

http://www.filosofia.ufc.br

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