“A oração do ateu”.
Ouve meus rogos Tu, Deus que não existes,
e em Teu nada recolhe estas minhas queixas;
Tu, que aos pobres homens nunca deixas
sem consolo de engano. Não resistes
ao nosso rogo, e nosso anelo viste,
quando mais Te afastas de minha mente;
mas recordo os doces conselhos somente
com que minh’alma acalentou noites tão tristes.
Quão grande és, meu Deus! Tu és tão grande,
que não és senão Idéia; é muito estreita
a realidade por muito que se expande
para abarcar-te. Sofro eu por tua causa,
Deus não existente, pois se tu fosses realidade,
eu também existiria de verdade.
(Unamuno)
Miguel de Unamuno nasceu em 1864, em Bilbao, na região basca, foi o terceiro dos seis filhos de Félix Unamuno, proprietário de uma padaria, e de Salomé Jugo, que era sua sobrinha. Quando seu pai morreu, Unamuno foi criado por um tio. Em sua infância, ele testemunhou a violência entre as forças progressistas e tradicionalistas durante o cerco de Bilbao, essa experiência deixou marcas profundas no seu pensamento político. Cursou filosofia e letras. Recebeu o título de doutor ao apresentar uma tese sobre a língua basca. Dominava 14 idiomas, e para ler Kierkegaard no idioma original, aprendeu dinamarquês. Voltou para Bilbao, onde ficou até 1891. Foi nesse ano que Unamuno obteve a cátedra de Grego na Universidade de Salamanca e, em 1901, foi nomeado como reitor da mesma universidade. Em 1914, Unamuno foi destituído do cargo de reitor por causa de suas posições políticas. Apesar de ter retornado ao cargo foi afastado diversas outras vezes, pelos mesmos motivos. Em 1924 exilou-se na França, e lá ficou até 1930. No ano seguinte, com a proclamação da República, Unamuno pode assumir de novo o cargo de reitor na Universidade de Salamanca, desencantou-se com o governo republicano e passou a ser entusiasta dos militares rebeldes, que eram comandados pelo general Francisco Franco. Seu novo posicionamento fez com que fosse novamente destituído, em 1936 quando começou a Guerra Civil Espanhola. Os franquistas, após dominarem a cidade, levaram Unamuno de volta ao cargo, mas perdeu-o mais uma vez, ao criticar o governo de Franco. Ficou em prisão domiciliar, onde permaneceu até os últimos dias de sua vida. Miguel de Unamuno faleceu em 1936, em Salamanca. Unamuno é considerado o precursor do existencialismo em seu país, suas obras são conhecidas por romperem com os gêneros tradicionais. No centro do seu pensamento está o conflito profundo entre fé e razão, dois elementos que são, em princípio, antagônicos. A base sobre a qual Unamuno constrói seu pensamento é a afirmação de que não há filosofia sem um ser humano que filosofe, isto significa que a filosofia é um produto humano e de cada filósofo, e cada filósofo é um homem de carne e osso que se dirige a outros homens de carne e ossos como ele. Unamuno chama este homem que filosofa de "homem concreto, de carne e osso" e afirma que ele é o sujeito e, ao mesmo tempo, o supremo objeto de toda filosofia, assim, Unamuno conclui que filosofa o homem, e evoca um velho provérbio latino: " Priimum vivere, deinde philosophari ", (primeiro viver, depois filosofar) para lembrar que o filósofo antes de ser necessita viver para poder filosofar. É entre a vida e o pensamento, entre a existência e a filosofia, a racionalidade e a irracionalidade, que Unamuno localiza a fome de imortalidade, tão presente em sua obra, que revela a sede de eternidade e o desejo de querer viver sempre, presentes nos seres humanos. A fome de imortalidade nasce da constatação de que não podemos conceber-nos como não existindo, e, a partir disso, surge o anseio humano pela imortalidade, pela eternidade, que não é outra coisa que o amor entre os homens, pois quem ama a um outro é porque quer eternizar-se nele. Frente a vaidade do mundo Unamuno contrapõe o amor, sendo o único que preenche e eterniza a vida, o que pode lutar contra o destino, e o único que pode vencer o destino, e uma vez vencido o destino, abrem-se as portas da liberdade.
Site de referência:
http://pensador.uol.com.br
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