quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

A carne, o verbo, o desejo, a linguagem, a história se entrelaçam e constituem o visível e o invisível do corpo.



Merleau Ponty:


Maurice Merleau-Ponty nasceu no dia 14 de março de 1908, em Rochefort-sur-Mer, no departamento de Charente-Maritime, na França. Seu pai foi morto durante uma batalha da I  Guerra mundial, em 1914. Foi educado por sua mãe, vivendo em companhia de uma irmã e um irmão mais velho. Apesar da perda do pai Merleau-Ponty parece ter tido uma infância feliz, porque se refere a sua doce contingência natal em algumas passagens do livro  "Fenomenologia da Percepção", considerado sua principal obra, diz o filósofo: "É no presente que compreendo os meus vinte e cinco primeiros  anos   como uma infância prolongada que devia ser seguida por uma servidão difícil, para chegar, enfim, à autonomia. Se me reporto a esses anos, tais como os vivi e os trago em mim, sua felicidade recusa-se a deixar-se explicar pela atmosfera protegida do ambiente familiar, é o mundo que era mais belo, as coisas que eram mais atraentes, e nunca posso estar seguro de compreender o meu passado melhor do que ele se compreende a si mesmo quando o vivi, nem fazer calar seu protesto. A interpretação que lhe dou está ligada à minha confiança na psicanálise; amanhã, com mais experiência e mais clarividência, talvez eu a compreenda de outra maneira e, consequentemente, construa de outra maneira o meu passado." Merleau Ponty frequentou a Escola Normal Superior, em Paris, formou-se em filosofia em 1931. Durante a II Guerra Mundial (1939-1945), participou do Exército francês como oficial. Em 1945 tornou-se professor de filosofia na Universidade de Lyon e, em 1949, assumiu a cátedra da mesma disciplina na Sorbonne, em Paris. A partir de 1952, foi convidado a lecionar no Collège de France. Nesse período também colaborou na revista "Les Temps Modernes" com o filósofo Jean-Paul Sartre. Rompeu com ele em 1953, por causa da simpatia de Sartre pelo partido comunista francês e pela União Soviética (URSS) de Stalin. Entre suas principais obras estão a Fenomenologia da Percepção (1945), O Elogio da Filosofia (1953) e Sinais (1961). Também produz ensaios sobre política, como Humanismo e Terror (1947). Morreu em Paris em 4 de maio de 1961aos 53 anos,acometido por trombose coronária. Merleau Ponty é considerado um dos mais importantes pensadores modernos, ele compreende a reflexão e a existência como a presença do ser no mundo, cuja expressividade o corpo possibilita e inaugura. As dimensões do pensar, da temporalidade e da liberdade são vistas como possibilidades do ser no mundo, expressões existenciais do sujeito encarnado. O tempo é a maneira como o ser humano concretiza o seu próprio ser e, por extensão, o ser dos outros. O tempo é a forma como projetamos nossas experiências, nossa relação com os outros. Nesse movimento, o sujeito e o mundo vão projetando sentidos. Em 1926 Ponty conheceu JeanPaul Sartre, Simone de Beauvoir, Claude Lévi-Strauss e outros estudantes que nessa época questionavam a filosofia ensinada na Universidade e nos liceus, cujos cursos abordavam 
somente até Kant. Eles reconheciam a importância do filósofo alemão, mas queriam que a filosofia 
tratasse dos problemas e questões de sua época, tais como: novas descobertas da psicologia e da psicanálise; a iminência da guerra, da luta de classes; o movimento impressionista e o surrealismo no campo da arte. Enfim, que a filosofia se preocupasse com a existência humana. Esse movimento causou grande impacto na intelectualidade francesa, sobretudo por pensar a condição humana em seu meio natural, cultural e histórico, como ser-no-mundo, mas do que como essência ou como  ser ideal, como fazia a chamada filosofia da consciência, inaugurada por Descartes e estabelecida com Kant.  Merleau-Ponty, dizia Sartre, fez com que abandonássemos o  lampião para deslocar a reflexão para o homem que o acendia. O que os homens fazem, pensam, o que falam,  suas dores e alegrias, seus desejos, é o que interessava a Merleau Ponty. Buscar os sentidos, as intenções e a reaprender a ver o mundo, é o que compôs seu método de investigação filosófica.  Se não fosse filósofo poderia ter sido antropólogo, como o amigo Lévi-Strauss. Simone de Beauvoir afirmava que Merleau-Ponty tinha um profundo respeito pelas ideias e que demonstrava rigor com as palavras, expressando-se por meio de atitudes comedidas e muitas vezes demasiadamente cerebrais, embora fosse extremamente gentil e sereno. Sempre reservado, sabia se posicionar de modo elegante. Mesmo em férias, dedicava, diariamente, duas a três horas ao estudo, leituras e anotações  para os cursos e para os livros. Como professor, influenciou uma geração de novos alunos, alguns deles mais tarde tornaram-se grandes pensadores, tais como Le Breton, Pontalis, Foucault, entre outros. Em suas memórias, a autora nos conta o envolvimento afetivo de Merleau-Ponty com Elisabeth, Zazá.  O romance não deu certo, por proibição dos pais da moça que ameaçaram o jovem Merleau Ponty de tornar público o envolvimento de sua mãe com um professor universitário.  Para não prejudicar a reputação de sua mãe e comprometer o casamento da irmã, ele afasta-se de Zazá. A jovem adoeceu e com transtornos psiquiátricos foi internada em uma clínica, onde morreu.  Posteriormente Ponty casou-se com Suzanne e teve uma filha, Marianne. Em 1949 Ponty assumiu a cadeira de Psicologia e Pedagogia na  Sorbonne, sendo substituído por Piaget, em 1952, ao assumir a Cátedra  de Filosofia no  Collège de France. Destaca-se a polêmica entre os que defendiam  a postura fenomenológica e os que defendiam a epistemologia genética. Piaget contava, com humor, ter lido em uma das provas, quando do primeiro exame que aplicou aos alunos de Merleau-Ponty, a seguinte frase: "Piaget não entendeu nada como provou o professor Merleau-Ponty", referindo-se às críticas aos estágios do pensamento propostos por Piaget. Merleau-Ponty viveu a Segunda Guerra Mundial e a ocupação da França pelos alemães. Junto com Sartre e outros intelectuais franceses fez parte da resistência em um grupo criado por eles chamado Socialismo e Liberdade.  Essa atividade política contribuiu para suas reflexões sobre a história, a política e a dialética. Com o fim da Guerra, em 1945, funda com Sartre a revista  "Les Temps Moderns" (Tempos Modernos), da qual será o editor político até 1952. Essa era uma época de vigor do pensamento marxista, Ponty escreveu vários artigos,  nos quais críticou a ortodoxia marxista e marcou suas divergências políticas com Sartre. Nestes escritos, teceu considerações sobre as interpretações mecanicistas do marxismo que afetavam a compreensão da dialética, dos movimentos revolucionários e da História. Em 15 de janeiro de 1952,  Merleau-Ponty pronunciou no Collège de France sua aula inaugural intitulada "O elogio da filosofia", cujo texto foi publicado em 1953. Neste ensaio, disse que o que caracteriza o filósofo era o movimento que levava, incessantemente, do saber à ignorância, da ignorância ao saber. Em 1961,  publicou o ensaio  "O olho e o espírito", considerado como um ensaio estético, um exame sobre a pintura e sobre o sensível como modo de conhecimento. Sabe-se que Merleau-Ponty era apaixonado pela pintura, segundo amigos,  ele sempre buscou novas formas de pensar e interrogava até o mínimo gesto, o menor detalhe de uma sensação ou de uma imagem. Era um homem de nuanças, de fronteiras, de ligações, talvez por isso tenha elegido o corpo como tema privilegiado de sua filosofia. " O visível e o invisível" contém o afastamento de Merleau-Ponty de uma filosofia da consciência e o investimento em uma filosofia da carne, do ser selvagem e  do corpo apanhado na experiência sensível. Essa obra aprofunda e amplia as idéias contidas em suas primeiras obras, enfatizando a subjetividade encarnada e reconhecendo a necessidade de manter o ponto de vista da consciência, o sentido do corpo e do sensível como realidade essencial do humano. Essa trajetória de Merleau-Ponty não é marcada por uma primeira fase de adesão à filosofia da consciência e uma outra fase de definição da ontologia do sensível, sem comunicação entre ambas. Desde os primeiros trabalhos já se delineia a corporeidade como realidade ontológica, sendo inegável a relação do corpo com o sensível. É importante compreender o que significa essa ruptura com a filosofia da consciência em Merleau-Ponty e as possíveis contribuições para as investigações  contemporâneas do ser humano e de suas mais diversas produções, colocando em cena o ser selvagem e o corpo. A experiência do corpo configura um conhecimento sensível sobre o mundo expresso,  pela sensibilidade dos gestos, das relações amorosas, dos afetos, da palavra dita e da linguagem poética, entre outras possibilidades da experiência existencial. "A apreensão das significações se faz pelo corpo: aprender a ver as coisas é adquirir um certo estilo de  visão, um novo uso do corpo próprio, é enriquecer e reorganizar o esquema corporal" (Ponty). A carne, o verbo, o desejo, a linguagem, a história se entrelaçam e constituem o visível e o invisível do corpo.

Referências Bibliográficas:
CARMO, P. S. Merleau-Ponty: uma introdução. São Paulo: EDUC, 2002
COELHO JUNIOR, N. & CARMO, P. S. Merleau-Ponty: filosofia como corpo e existência.

Site de referência:
http://www.cbce.org.br/cd/resumos/129.pdf
São Paulo: Escuta, 1991


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