José Antunes de Sousa é licenciado, mestre e doutor em Filosofia pela Universidade Católica Portuguesa e Professor do Instituto Superior de Estudos Interculturais e Transdisciplinares do Instituto Piaget de Almada.
Estudioso da obra de Vergílio Ferreira publicou A Questão Ética em Vergílio Ferreira (2006) e Vergílio Ferreira e a Filosofia da sua obra Literária (2009). Neste seu último livro, reflecte sobre o lugar do pensamento na criação literária, destacando as relações da literatura e da filosofia, do conhecimento e da linguagem. Em 2008 foi co-editor das actas do colóquio Vergílio Ferreira no Cinquentenário de Manhã Submersa, realizado na Universidade Católica de Lisboa em 2004.
Vergílio Ferreira e a Filosofia da sua Obra Literária:
O dizer eminentemente poético que, na prosa de Vergílio Ferreira, se diz, insinua-se nos a partir da secreta instância do tudo por dizer que nesse dizer se oculta.As suas obras, que são uma só, a romanesca, a ensaística e até mesmo a diarística, formam um quiasma vivo (o desprezo que Vergílio nutria pelas "verdades indiferentes"!), sempre naquela balbuciação em sangue de um valor que definitivamente nos pacificasse a alma.Nessa busca ansiosa de um além que importaria, além de tudo, o fosse já cá, nesta vida, e que é o valor absoluto, Vergílio Ferreira desdobra se num balanço doloroso entre o irrecusável do "homem fundamental" e o mísero destino que o espera na escuridão opaca do túmulo. E vai reclamando das estrelas um desígnio que sabe estar destinado a dissipar se na terra.A extensa obra de Vergílio Ferreira não cessa de nos alarmar com imprevistas fosforescências, não raro cintilantes, de sentido, um sentido que se faz da dramática consciência do excesso que nos constitui, mas que, afinal, é "tanto para nada". E um intersticial vislumbre de um futuro que nos contrariasse neste nosso clamor de nada eis que percorre, apofaticamente, toda a obra vergiliana cujos heróis, inchados de augúrio e de promessa, acabam por soçobrar, vítimas da "Sem Razão" da "Grande Ordem", sob o peso, enfim, de um destino à medida da "barriga das minhocas".Mas, no fim de tudo, que é, paradoxalmente, um final que se sente desde o início, subsiste em tudo o que por Vergílio foi dito um doce mas inquieto travo de insubmissão e de uma ínvia esperança, por entre o tumulto do incessante e estrénuo caminhar. Porque não nos aguarda a placidez serena da chegada, mas essa infinda sucessão de pontos de partida impõe se nos apenas isto: ser homens "até mais não..." E sê lo na esquálida razão de o ser.
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Integrado no "Colóquio Internacional Vergílio Ferreira" no cinquentenário de Manhã Submersa: filosofia e Literatura, realizado em Março último na Universidade Católica Portuguesa (Lisboa), onde foram apresentadas comunicações importantes de Robert Bréchon, Eduardo Lourenço, Luís Mourão, Helder Godinho, José Esteves Pereira, Fernanda Irene Fonseca, Rosa Maria Goulart, entre outras, foi lançado o livro de José Antunes de Sousa Vergílio Ferreira e a Filosofia da sua Obra Literária, em que pela primeira vez se estuda em profundidade o sentido filosófico da ficção do autor de Para Sempre. Doutorado em Filosofia pela Universidade Católica Portuguesa e professor do Instituto Piaget, José Antunes de Sousa é hoje investigador do Centro de Literatura e Cultura Portuguesa e Brasileira na mesma Universidade e colabora com regularidade em revistas e jornais. Ao abordar a filosofia na obra literária de Vergílio Ferreira, nas vertentes mais essenciais do que a fundamenta, o autor não deixa de fazer incidir o seu estudo nos aspectos e limites de uma obra que é posta em paralelo com outros autores portugueses, ao mesmo tempo que destaca as relações da literatura e da filosofia, da ética e do materialismo metafísico, do humanismo e de Deus, do conhecimento e da linguagem que aparecem estudadas em profundidade e com grande rigor filosófico. De facto, trata--se de um primeiro e essencial estudo da obra vergiliana na perspectiva da filosofia, onde se não esquecem os conceitos de sujeito e linguagem, Deus e divindade, tempo e temporalidade, os mitos do Transcendente, ou ainda o sentido da fala e da escrita, da linguagem e o mundo que em Vergílio Ferreira, como é demasiado eviente nos seus ensaios e anotações de diário, ganham um espaço de eleição ou de preferência nas questões que sempre soube inquirir ou abordar. Por isso, este estudo do Prof. José Antunes de Sousa é realmente denso e exaustivo ao longo de quinhentas páginas e afirma-se, sem dúvida, como um excepcional contributo para o melhor conhecimento da obra literária de Vergílio Ferreira. E é isso que ressalta, na evidência dos valores defendidos pelo prof. José Antunes de Sousa neste admirável estudo ao ter sabido colocar em destaque, com grande rigor de interpretação, os conceitos e mitos que consubstanciam a obra vergiliana - sinfonia em louvor da vida e desde sempre saber, como diz em Invocação ao Meu Corpo, que "o que existe para o homem é o absoluto da sua hora e tudo o que para lá existe, existe apenas coordenado com ela, a ela subordinado".E, na atitude de tudo globalizar na ficção ou ensaísmo literário, se poder encontrar uma "explicação" para o que é do homem mais essencial, porque toda a obra se define dentro de coordenadas que, na aceitação ou recusa dos valores mais autênticos, Vergílio Ferreira exigiu que a sua coerência intelectual se afirmasse através de um itinerário tão próprio e de excepção na moderna literatura portuguesa, sem se desviar dessa posição inconfundível de quem encarou a literatura como o acto maior e único de estar vivo.
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